terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Salvar ou não salvar uma vida?



(questão levantada no blog do Instrutor do Método DeRose, Marco Carvalho, em 9 de janeiro de 2011.)

Ontem no meu banheiro um pequeno bezouro marrom estava sendo atacado por milhares de formigas. Ele se contorcia, fugia, tentava se salvar, mas pelo visto o veneno das picatas estava fazendo efeito. Ele corria e logo se contorcia, parecia sentir muita dor, ou o veneno das picadas estava atrapalhando sua coordenação motora.

A princípio não iria interferir, mas assim que virei as costas pensei:

- Ahimsa, aquele que não defende um inocente, podendo defender, acumplicia-se do ato.

“Ok”, pensei comigo. Peguei um cotonete e coloquei próximo as patas do besouro que a esta altura já estava de costas ao chão. Coloquei-o próximo a janela e ele ficou parado sobre o cotonete. Hoje fui ao banheiro e encontrei-o mumificado preso a teias de alguma aranha que deve estar satisfeita com sua refeição.

As perguntas:

1. Adiantou salvá-lo das formigas?
2. Era a hora do besouro?
3. Quando é a hora de ajudar?
4. Quando é a hora de deixar acontecer?

Para a primeira eu acredito que sim, pois eu podia salva-lo. Já da aranha eu não podia, pois não estava presente, se estivesse salvaria. Assim como salvaria um gato sendo atacado por um cachorro. Ou um cachorro sendo atacado por um “cerumano” (os da espécie homo-imbecilis). Ou tentaria salvaria aquele que amo de algum infortúnio.

Se nossa mãe estiver em perigo eminente, quando próximos não mediremos esforços para ajudar, mas se estivermos longe não poderiamos… logo, acredito que fiz o que deveria ter feito em relação ao besouro.

Já as outras perguntas eu deixo você responder de acordo com suas crenças…


(minha resposta)

Já que a proposta é uma espécie de discussão aberta, vou me arriscar atrevendo-me a expandí-la.

Há vários aspectos que devem ser analisados, mas comecemos pela evolução natural das espécies.

Tanto a evolução das espécies quanto o equilíbrio ambiental são dependentes diretos da cadeia alimentar.

Por exemplo, se resolvessemos salvar todos os mosquitos evitando que eles sejam comidos pelos sapos de uma determinadalagoa, intervindo na cadeia alimentar deste sistema, acabaríamos extinguindo os sapos, que morreriam de fome e tendo uma super-população de mosquitos, que poderiam procriar tranquilamente sem seus predadores naturais. Isto seria desastroso.

Utilizando este mesmo cenário, se nos abstermos de intervir no equilíbrio ambiental, possibilitaremos que tanto os sapos quanto os mosquitos sobrevivam e evoluam. Mas, evoluir? Como?

A cadeia alimentar ajuda nesta evolução eliminando os mosquitos mais fracos e lentos pois estes seriam presas fáceis para os sapos - somente os mosquitos mais "espertos" procriariam mantendo uma linhagem genética "melhor". O mesmo ocorreria com seus predadores, os sapos, pois somente os mais rápidos conseguiriam capturar mosquitos suficientes para sua sobrevivência.

Ok. Esta seria uma análise darwiniana que, apesar de parecer óbvia, religiosos discordariam e tem outro aspecto "negativo": é muito utilizada para justificar o neoliberalismo e a "lei do mais forte" no mercado, defendendo que o Estado não deveria intervir neste "equilíbrio natural" defendido por Adam Smith. Ao meu ver, este equilíbrio mercadológico onde quem tem mais devora quem tem menos deveria ser chamado "equilíbrio selvagem" para combinar com o capitalismo que, não por acaso, também é denominado "selvagem".

Dando continuidade ao raciocínio e voltando para questão levantada, observemos a evolução da própria espécie humana.

O Homo Sapiens Neanderthalensis, conhecido como Neanderthal devido as suas características genéticas não conseguiu adaptar-se e sobreviver à competição com o Homo Sapiens Sapiens, nosso atual estágio evolutivo segundo os historiadores naturais.

Todas as espécies tem por instinto mais primitivo a sua preservação e sobrevivência. Depois da "ascenção" do Homo Sapiens Sapiens não tivemos nenhum outro "competidor" na face da Terra e, graças ao nosso polegar opositor e ao lóbulo frontal cerebral desenvolvido, pudemos, nós mesmos, criar nossas "evoluções artificiais".

As ferramentas criadas pelo homem são grandes aliadas na MANUTENÇÃO de nossa espécie.

Por que o destaque na palavra "MANUTENÇÃO"? Para explicá-lo citarei duas invenções humanas importantíssimas: o medicamento e a prótese.

Na natureza, excluindo-se o homem, qualquer ser adoentado está fadado a morrer. Se este não tiver tempo para procriar, acaba ajudando na evolução de sua espécie pois sua linhagem genética suscetível a determinadas doenças é eliminada deixando que apenas os espécimes mais saudáveis procriem.

Fato semelhante ocorre com seres que nascem deficientes. Algumas espécies de animais simplesmente abandonam os filhotes que nascem com dificuldades de locomoção, sem alguma parte do corpo ou mesmo, com partes que não funcionam corretamente. Mais uma vez a espécie "ganha".

O que isto tem a ver com a "manutenção" da espécie humana?

Quando usamos medicamentos para manter vivos espécimes humanos que não tem condições de sobreviver sem o uso deles, acabando permitindo que sua linhagem genética perpetue-se, passando para a próxima geração o "defeito" de ser suscetível a determinadas doenças.

Como exemplo de prótese, utilizarei os óculos, que nada mais são do que olhos postíços. Qualquer animal, excluindo-se o homem, que nasça sem enxergar bem seria incapaz de locomover-se adequadamente e de escapar de predadores. O homem míope que seus óculos, vive tão bem quanto qualquer outro ser e, mais uma vez, tem a oportunidade de manter sua linhagem genética.

Darwin, cientista, diria que medicamentos e próteses seriam uma "infração" a lei da evolução da espécie. Um tipo de trapaça, que, no fim das contas, não permite a EVOLUÇÃO genética de nossa espécie, mas apenas uma MANUTENÇÃO de genes. Alguns religiosos defenderiam o mesmo ponto alterando o argumento, dizendo que o homem estaria se intrometendo nos "desígnios divinos" e neonazistas fariam a festa com o argumento de que uma limpeza genética estaria apenas "seguindo as leis da Natureza".

Até aqui, de tudo que escrevi, nada se parece com uma resposta ou argumento. São apenas proposições. Como todo bom filósofo, prosseguirei neste caminho.

Qual seria o ponto de vista da filosofia em relação a "salvar o besouro ou deixá-lo morrer" (achou que eu já tinha me esquecido do assunto, né?)

Se conhecemos a lei de ação e reação (karma) então temos consciência de que AGINDO OU NÃO-AGINDO estaremos gerando karma, isto é, agindo ou não, todos nós colheremos o resultados das nossas ações (inclusive da ação de não fazer nada).

Apesar não ser hindú, assumo as leis de ação e reação e de livre arbítrio como as únicas coisas absolutas e inquestionáveis no Universo e delas não podemos escapar.

Como não posso evitar o karma em meu atual estágio evolutivo, salvar ou não salvar o besouro ou qualquer outra criatura, daria na mesma. Como os conceitos de "certo" e "errado" estão ligados ao meu próprio julgamento (meu arbítrio), desde que eu esteja consciente e pronto para o resultado que colherei de minhas ações, karma nenhum será negativo.

Então, concluindo e, finalmente, dando a minha resposta, não importa qual será o argumento que você utilizará para justificar suas ações. Se você vai embasá-la na Ciência, na Religião, na Filosofia ou no Horóscopo, isto é contigo. O que importa é que você tem que estar consciente de que, na verdade, salvando ou não o besouro, o único que poderá emitir um julgamento é você mesmo.

Desde que você possa dormir em paz com tuas ações e consciente dos resultados destas, faz o que tu queres. Há de ser tudo da lei (da ação e reação)!

É isto.